sábado, 10 de janeiro de 2009

QUAL O VALOR DO AXÉ?



(Por Ìyálórìsà Fernanda t'Òsun Doko, secretária executiva do Egbé Òrun Àiyé-RS)








Por que a maioria das pessoas preocupa-se hoje em dia com o custo de uma obrigação e não com o significado dela? Se é da vontade do meu Orixá que eu faça obrigação a ele, ele vai me colocar em um local sagrado, no qual ele está disposto a receber esse sacrifício, e não vai me dar condições de arcar com os custos materiais dessa obrigação? Tantos questionamentos a respeito de “valor de axé”, “custos de obrigação” levam-me sempre à pergunta: onde andará a fé nos Orixás?

Afinal, quem tem escolhido o destino religioso desses seres humanos que medem sua Orixalidade em valores materiais? Será que o Orixá dessas pessoas é tão ruim que as coloca em lugares nas quais serão humilhadas por não terem dinheiro de arcar com as suas obrigações aos próprios Orixás? Elas buscaram a real orientação do seu Orixá-Ori nesses momentos de escolha, de entrega e de comprometimento ou foram levadas por outros valores ou motivações no momento de entregarem sua vida espiritual e religiosa na mão de algum sacerdote?

Se o Orixá quer que seu filho faça obrigações em com aquele sacerdote e é ali lugar que esse Orixá escolheu para que fosse feita essa ligação tão importante entre ele e o ser humano, que é o ponto-chave de toda a religiosidade africanista, a união entre o mundo material e o espiritual, ele não dará condições ao filho para isso?

Sabemos que essas questões são individuais, e só nós, temos a exatidão do nosso relacionamento com nosso Orixá-Ori e com os demais, pois isso não é algo apenas externo. Nossa conduta de fé ficará evidente em inúmeras situações do nosso dia-a-dia, àqueles que possuam conosco o convívio, mas a essência desse relacionamento estará sempre nas nossas mentes e nos nossos corações, na maneira como sentimos, pensamos e agimos... Na maneira como pessoal e internamente ACREDITAMOS e nos ENTREGAMOS.

“...ele não dará condições ao filho para isso?”
Caso isso aconteça, pode ser que esse “filho” seja dos tantos que realmente não estão prontos para ter essa ligação entre ele e o Orixá estabelecida, reafirmada ou continuada, o que é muito comum nos dias de hoje. Pode não ser da vontade do Orixá obrigação naquele momento, ou com aquele sacerdote. É possível que o Orixá queira ver a força da fé do filho em persistir e perseverar para dar-lhe a devida obrigação! Enfim, são inúmeras possibilidades nesse caso; em cada caso, pois cada ser humano possui seu Odu pessoal e seu relacionamento em nível individual com as divindades.

Ao meu ver, as pessoas que ao longo do percurso abandonam a sua religiosidade e crença aos Orixás por fatores materiais ou interpessoais não estavam aptas para esta prática, para está fé, para esta filosofia. Para praticar verdadeiramente a religião de matriz africana é necessária uma plena noção da responsabilidade que devemos ter perante as Divindades, responsabilidade essa que vai aumentando gradativamente com o grau iniciático.
Essa responsabilidade implica em SACRIFÍCIO.

Segundo dicionário disponibilizado on-line pela Priberam Informática:
“Sacrífício:
do Lat. sacrificiu

s. m., acto ou efeito de sacrificar; oferta de vítimas ou de donativos à divindade, revestida de certo ritual, para expiação da culpa ou para implorar auxílio; imolação; sofrimento;
fig., privação voluntária em benefício de outrem; renúncia; abnegação;
(no pl. ) trabalhos, canseiras.”


Segundo o dicionário Michaelis:
“sacrifício
sa.cri.fí.cio
sm (lat sacrificiu) 1 Ação ou efeito de sacrificar. 2 Oferenda de animal, produto da colheita ou de qualquer coisa de valor, feita a uma divindade para lhe tributar homenagens, ou para reconhecimento do seu poder, ou ainda para lhe aplacar a cólera. 3 A pessoa ou coisa sacrificada. 4 Renúncia voluntária a um bem ou a um direito. 5 Ato de abnegação, inspirado por um veemente sentimento de amizade ou de amor. 6 Privação, voluntária ou involuntária, de uma coisa digna de apreço e estima. 7 Risco em que se põem os próprios interesses para interesse de alguém ou de alguma coisa. 8 Constrangimento, sofrimento. 9 Despesas, custos. 10 Bel-art Desprezo de certos acessórios para fazer realçar numa obra as partes principais. 11 No jogo de xadrez, entrega de peça ou pião com vistas a melhoria posicional. O s. de Jesus: a sua morte na cruz para redenção da humanidade. S. do altar: a missa. S. humano: imolação de uma pessoa como vítima à divindade. S. incruento: sacrifício em que não se derrama sangue; a missa. Espírito de sacrifício: inclinação, tendência para sacrificar-se por ideais, pessoas etc.”

Quantos tem a real noção de que nossa religião implica necessariamente em SACRIFÍCIO antes de fazerem o processo iniciático? Quantos “compram” a promessa que ser de religião africanista é uma vida apenas de caminhos abertos para dinheiro, amor, alegria e felicidade? Quantos vendem essa promessa? E quantos enchem a boca para se dizerem “filhos de Orixá” mas na verdade o que buscam dentro da religião são apenas satisfação material, amorosa, profissional, etc... mas na hora do sacrifício sempre estão cheios de reclamações, comparações, medidas!?!? Seres egoístas, mesquinhas e sem nenhuma noção de religiosidade, pois querem é apenas receber, sem fazer a sua parte para isso!

E a questão do sacrifício de valores materiais(dinheiro propriamente dito) ainda considero ser a mínima, apesar de ser tão ferrenhamente questionada e debatida. Tanto que essa parte aparece pequenina e apenas na segunda definição do que significa sacrifício (9 Despesas, custos).


Orixalidade e axé não se compra! Não têm valor em reais, dólares ou euros!!!

Quem é sacerdote religioso, já tendo atingido o grau mais elevado de obrigações aos Orixás e recebido os axés de Obé e Ifá, pode e deve colocar preço para disponibilizar de seu axé, de seus serviços como sacerdote religioso. E esses serviços não têm valor tabelado como carteiras de cigarro! Apesar de ser a preocupação de muitos “religiosos” a comparação de preços de axés! Muitos colocam a “cabeça a prêmio”, em que o que vale não é a vontade do Orixá, e sim quem “cobra” menos pelo “serviço”. E realmente, o pior de tudo é quem oferece o tal “serviço” de botar no chão! Uma tamanha falta de responsabilidade perante os seus próprios Orixás e de dignidade na utilização dos axés que deles recebeu!
Mas dolorosamente essa é nossa realidade!
Muitos nem sabem a diferença entre fazer um serviço e fazer a ligação entre o ser humano e seu Orixá-Ori. Entre fazer feitiços e assentar Orixás!

Os salões de batuque estão lotados!!! E há cada dia mais e mais salões!!!
Mas quantos desses seres humanos sabem o que estão fazendo ali?
Ou melhor, quantos sabem o que deveriam estar fazendo ali?
Ainda, sabem o significado de tudo isso?
Do que realmente é SER um religioso de matriz africana???

A minha resposta pessoal à pergunta inicial:

Qual o valor do axé? SACRIFÍCIO!

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